BATMAN/JUSTICEIRO PARTE II
ATENÇÃO!
Este texto contém altos spoilers da edição “Batman/Justiceiro: Cavaleiros Mortíferos”.
Depois não diz que eu não avisei.
Nota do colunista: Dando uma colher de chá para aqueles que não fizeram CCAA, Wizard, Cultura Inglesa ou CNA (e também porquê acabou sendo mais fácil pegar tudo direto da revista do que procurar pela Internet), vou usar imagens em português dessa vez. Mas não se acostumem. Bjo amo vcs bjo.
“Foi o melhor dos tempos, foi o pior dos tempos, foi a idade da sabedoria, foi a idade da tolice…”
Quando dizemos que Charles Dickens era um visionário, não tenho dúvidas sobre o que ele imaginava enquanto escrevia este primeiro parágrafo do romance Um Conto de Duas Cidades: o mercado de quadrinhos em meados dos anos 90!
O número de leitores era absurdo, ao passo que a especulação em cima das HQs criava capas alternativas, metalizadas, 3D, e empurrava todo o mercado para uma crise sem precedentes. Personagens mais populares ganhavam trocentos títulos solo desnecessários, que muitas vezes nem ao menos conversavam entre si, além de participarem de todas as outras revistas da editora. A moda era heróis musculosos, cheios de dentes cerrados e poses heroicas (para que, pasme!, as artes originais valessem mais grana em convenções e leilões), heroínas voluptuosas em trajes mínimos e poses sexuais, personagens com cara de mau, desproporcionalmente grandes em uniformes estilosos, pensados para vender bonequinhos.
E violentos.
Sombrios e violentos.
Todos eles. Quanto mais violentos, melhor.
De repente, era 1995, e tudo isso começou a desmoronar.
O descaso progressivo dos leitores apontava o desgaste da fórmula. As vendas de Spawn começaram a patinar. O Wolverine (que havia perdido seu adamantium e fator de cura anos antes) seguia sem muito rumo criativo. A popularidade de um WildC.A.T.s deu lugar à agilidade juvenil e leve de um Gen13.
E talvez o capote mais violento (háhááá) dessa onda tenha rolado com seu símbolo principal, o Justiceiro. No mesmo mês, o personagem teve seus 3 títulos cancelados, substituídos por um único. A contínua queda de interesse acabou resultando em decisões editoriais apelativas, e de repente, depois de virar chefão do crime e pseudo-agente da SHIELD – pausa para um respiro – nosso Frank Castle se suicida (!), e é ressuscitado (!!) como um anjo com poderes sobrenaturais (!!!), assassinando pecadores (!!!!) para se redimir e poder ir pro céu (!!!!!), uma maneira de compensação dada pelo anjo Gadriel (!!!!!!), que era o anjo da guarda do Frank (!!!!!!!) e falhou em evitar que sua família fosse morta a mando do Inferno (!!!!!!!!), que fez isso para que o Justiceiro matasse por eles (!!!!!!!!!).
Sim.
Sim, isso aconteceu.
E durou de 1998 até 2000, quando Garth Ennis retornou com o conceito original do personagem, fechando tudo em 3 páginas, pra essa fase nunca mais ser citada depois disso.
Como se tivesse previsto essa reviravolta no mercado, a DC concluía um ano antes, em 1994, a saga A Queda de Morcego, retornando com Bruce ao manto do Batman, provando que ele sim era um herói muito superior ao violento e doido da piroca Jean-Paul Valley.
E foi nessa época, 4 meses depois do primeiro crossover, que rolou o segundo encontro entre Batman e Justiceiro, Justiceiro/Batman: Cavaleiros Mortíferos.
Vamos ser sinceros aqui, esse sim é o crossover que vale.
Escrita pelo Tom DeFalco e desenhada pelo mestre John Romita Jr. (com arte-final linda do Klaus Janson), Cavaleiros Mortíferos pode não ser uma graaaande história, mas está anos-luz à frente da edição anterior. E, além do fato de ter o Bruce no papel que lhe é devido, existe um outro motivo pra isso: a arte do Romitinha.
Um detalhe: apesar do Retalho ter sido retratado em seu estado gordo no primeiro encontro (fato inclusive citado durante aquela história), aqui isso parece devidamente esquecido (ou ignorado).
A trama não é nenhum clássico da inovação, mas isso nem seria necessário.
O Justiceiro volta a Gotham procurando pelo Retalho, que se uniu ao Coringa, teve seu rosto reconstruído e, com a ajuda do palhaço, está em vias de se tornar o chefão do crime da cidade.. mas para isso precisa aniquilar o chefão atual, Jimmy Navarone. Em seu caminho, também vai ter um Bruce Wayne recém-retornado ao papel de Batman.
As recordações da aventura passada se limitam a um ou outro comentário feito pelo Justiceiro, pelo Batman e pelo Retalho. Coisas como “ele estava diferente a última vez que nos vimos” etc..
Coringa e Retalho acabam encurralando o bando do Navarone em um clube de apostas. Por fim, nossos heróis são pegos no fogo-cruzado no meio da guerra de gangues.
Enquanto os capangas se matam, rola a cena clássica do herói de uma editora contra o vilão da outra. O Batman nocauteia o Retalho fácil, enquanto o Justiceiro vai atrás do Coringa.
E esse final é tão lindo que foda-se meu texto, vou colocar ele na íntegra por aqui.
Ainda que não seja uma crítica tão explícita ao estilo anos 90 quanto foi o primeiro encontro, Cavaleiros Mortíferos dá as suas alfinetadas. Como por exemplo a surpresa do Coringa com a violência do Justiceiro, com a arma apontada para a cara, tentando se justificar dizendo ser um homem doente, e perguntando “você vai mesmo fazer isso?”. Seguido do Batman tomando a atitude mais extrema em relação a isso, e libertando o Coringa para poupar sua vida.
Sem contar, claro, a cena linda do Batman humilhando o Justiceiro. Repetir aqui, por motivos de Batman sendo Batman.
Isso tudo é para esfregar na cara do leitor que o Batman é um herói superior. Que o Justiceiro pode ser estiloso, mas que o Batman é supremo. Assim como foi em seu encontro com o Aranha (sobre o qual você pode ler na minha fabulosa coluna clicando AQUÊ), existe um respeito gigante em relação ao personagem. E diferente do primeiro encontro, onde Jean-Paul Valley é claramente ridicularizado, aqui o jogo vira. Castle leva a melhor entre os anti-heróis violentos. Mas contra um herói como o Batman, ele não tem a mínima chance.
Ah, sem contar um plot paralelo bem divertido entre o Robin e o Microship (espécie de sidekick do Justiceiro), numa batalha entre hackers. Uma puta sacada do DeFalco.
Apesar da trama básica, Justiceiro/Batman: Cavaleiros Mortíferos tem lugar entre os mais memoráveis crossovers já feitos.
E ainda serve como um símbolo do fim de uma era para os quadrinhos, na qual a violência descerebrada e estética prevalecia. Mais pro final daquela década, os roteiristas entenderam que essa mesma violência funcionava melhor quando não era gratuita. Obras como Authority, Superman: Elite e o próprio título do Justiceiro passaram a oferecer uma visão mais crítica desse estilo, com o objetivo de mostrar que o verdadeiro heroísmo será sempre o heroísmo clássico.
Exatamente como ensinou o Batman, lá nos idos de 1994…
Olá. Você ligou para a coluna Bruce Wayne Contra o Mundo.
No momento, não tô com a mínima paciência pra te atender, especialmente se você tiver vindo aqui pra criticar meu texto. Sério, prefiro assistir a versão estendida de BvS do que ficar te ouvindo reclamar. Que chatura!
Mas após o bip, deixe seu recado aqui nos comentários, que eu retornarei assim que possível.
Muito obrigado!
*biiiiiiiip